terça-feira, 21 de junho de 2011

O futuro do trigo

Na próxima semana vão ocorrer, em diversos locais do Paraná, Seminários para discutir "O Futuro do Trigo". Recebemos o convite, daí o Orlando fez este belo comentário, que vale para reflexão. Particularmente compartilho e concordo plenamente com tudo o que ele ponderou, acrescentando que há no Brasil uma distorção muito grande no consumo da nossa sociedade: um país tropical, que tem uma cultura praticamente sem risco, a mandioca, e consumindo pãozinho de trigo até no Nordeste, um produto que tem pouco a ver com nosso clima.
Abaixo, o belo texto do nosso grande companheiro:

"Apesar do corre-corre, uma pequena reflexão de quem está acompanhando o trigo (mesmo estando no Arenito quase sempre) como profissional e cidadão. Antigamente havia uma política específica de governo para dois produtos agrícolas que, diferentes dos demais, com mais status, se vinculavam a Institutos ligados ao MIC Ministério da Ind.e Comércio. Eram a cana, ligada ao IAA Instituto do Açucar e do Álcool e o Café, ligado ao poderoso IBC. Ambos eram produtos de primeira linha nas políticas de governo. Os demais, ficaram para o porão do poder, no Ministério da Agricultura. E o trigo, apesar de ser fortemente importado, tinha o CTRIN que era um orgão do BB, inclusive com equipe de Eng.Agrônomos, que era o executor de uma Política Nacional para o setor dessa cultura. Dentre outras coisas, o governo, que controlava "todo" o trigo que girava no Brasil, retinha 1% do valor para "pesquisa de trigo" e com essa verba se fez um conjunto de prédios e de pesquisa em Cascavel. Quando visitei lá há mais de 20 anos, era algo meio primeiro mundo para aquele tempo. Depois, a política do trigo mudou e a unidade de pesquisa passou para a OCEPAR e hoje é Coodetec.

Aqui já vai a primeira reflexão pessoal: O trigo é concorrente do arroz e da mandioca, ambos dois produtos com forte inserção na nossa economia rural e na dieta do nosso povo. E a mandioca é de baixo risco agronômico por ser de ciclo longo. Por que uma política de proteção ao trigo e que pode (e prejudica) os produtos similares que no Brasil tem raizes econômicas e culturais? A dirtorção fez até o povo no Norte e Nordeste do Brasil passar a consumir menos mandioca e mais trigo, fora da "cultura" do povo.

Mas o mais grave da época: O governo comprava todo trigo nacional e importado por algo como 500 dolares a tonelada e repassava aos moinhos por digamos 250 dolares. Era um subsídio (só ao trigo e somente só) de ao redor de 1 bilhão de dólares por ano, fora as indenizações de proagro que eram muito frequentes. Ao ponto de ser comum o agricultor comprar o adubo para o trigo com a mesma fórmula que a da soja e não usava o adubo no trigo e torcia para gear. Se geasse, era indenizado inclusive sobre o fertilizante que não usou.... e usava na soja, barateando o custo. Era um crime.

E lembrar que o trigo foi sempre pródigo em uso de fungicidas que nunca foram baratos. Umas chuvas à mais e babau o PH. E tem muita gente que até pouco tempo atrás falava desse tempo como período áureo do trigo. Era a meu ver a "farra do trigo".

Quem mais ganhava com ela era o pessoal dos insumos.

No tempo do Collor, mais por falta de caixa do que por juizo, acabaram com essa política do trigo e deixaram a cultura ao sabor do mercado. Mas e as outras culturas, como a mandioca e o arroz, não enfrentam o "sabor" do mercado? Por que só o trigo deveria ser protegido?

Com esse sistema anterior, ninguém se preocupava em ter trigo de qualidade, já que o governo comprava tudo e pagava o dobro do que valia no mercado lá fora. Os moinhos ganharam horrores de dinheiro e se estabeleceram nas zonas portuárias ou terminais de trem, tipo Ponta Grossa e tudo o mais. Os fretes, o governo dava conta de tudo e estocagem também.... Ver o tamanho da CONAB lá de Ponta Grossa.

Com o trigo entrando, menos por juizo do governo, mas por falta de caixa, ao mercado, as coisas começaram a patinar e inclusive os compradores passaram a exigir qualidade. E os produtores ainda não se adaptaram para entender que se um produto é para o "mercado", tem que ser produzido o que o mercado quer. Simples assim. E a cultura é de custo alto por causa do nosso clima e manejo e não é muito competitivo em termos internacionais. Esta é mais ou menos a realidade atual, sobre a qual os debates, espero, estejam sendo travados.

Abraços do colega ATR Eng.Agr.Orlando Lisboa de Almeida -Maringá - PR"

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